No passado mês de Junho foi publicado um relatório, coordenado por José Pereirinha, que procura responder à questão: Quanto é necessário para uma pessoa viver com dignidade em Portugal?. Esta investigação, intitulada “Rendimento Adequado em Portugal(RAP), foi conduzida por investigadores da Universidade de Lisboa (do ISEG e ISCSP), Universidade Católica Portuguesa (Faculdade de Ciências Humanas) e EAPN – Rede Europeia Anti Pobreza em Portugal, com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).

A pesquisa sobre a “adequação do rendimento” (valores de recursos considerados suficientes para possibilitar um nível de vida digno) procurou conhecer os padrões de vida dignos das famílias portuguesas atualmente (quais são as necessidades que todas as pessoas deveriam poder satisfazer: alimentação, habitação e vestuário, saúde, segurança, realização pessoal através do acesso à educação, trabalho, cultura e lazer). A metodologia utilizada passou pela construção de orçamentos de referência para diferentes tipos de família (Quadro 1).

Quadro 1_notícia RAP

O estudo aponta para que os valores de rendimento necessários para obter um nível de vida digno em Portugal são superiores ao valor do limiar oficial de pobreza (segundo o critério tradicionalmente usado pelo Eurostat que corresponde a 60% do rendimento monetário líquido mediano observado nesse ano) – isto é, este limiar pode estar a subestimar a incidência real da pobreza no país. No relatório apresentado refere-se a existência de uma discrepância por defeito entre os orçamentos RAP de diferentes configurações familiares e as estimativas da OCDE, e que tal desajustamento das escalas de equivalência para observar a pobreza distorce por sua vez “o perfil da população em situação de pobreza e subestimando em particular o cálculo da pobreza infantil em Portugal” (p. 15). Por fim, a partir dos valores calculados de Rendimento Adequado em Portugal, em 2017, estes são superiores aos valores mínimos implícitos pelas medidas de política de garantia de rendimentos mínimos – “acresce que para os casos de agregados com filhos menores de idade, o abono de família e os eventuais benefícios em espécie, conjugados com o salário mínimo dos indivíduos em idade ativa, estão muito aquém do valor estimado RAP” (p. 15).

As conclusões retiradas pela equipa de investigação permitem assinalar a importância de repensar a medição da pobreza em Portugal, assim como a necessidade de adequar as políticas na realização do direito universal a um nível adequado de recursos – por exemplo, a partir de alterações nos valores mínimos garantidos por diferentes medidas de política e configurações familiares. Estas podem incidir, segundo o estudo, “nos valores monetários garantidos, nas escalas de equivalência utilizadas, nos escalões de rendimento considerados (no abono de família, na ação social escolar, no IRS), nos limiares de insuficiência económica associados a diferentes benefícios em espécie, entre outros” (p. 15).

Por: Ana Rita Matias